Preciso poder sair de casa para exercitar o meu ganha-pão.

A moeda ganha não ia me ajudar em nada se eu não pudesse gastá-la. E os retratos-falados liberados, ao mesmo tempo, de todo o último time que eu tinha participado, começavam a criar uma mancha no meu currículo que eu definitivamente não estava disposto a manter. Aí as coisas começaram a ficar mais estranhas ainda: Um outro Harbinger me procurou. Especificamente.

A mensagem chegou por um courier seguro, mas mesmo assim, me preocupou. Instruções para se encontrar num café, numa área moderninha e segura da cidade-alta. Desobedeci as instruções e fui armado, claro. Usei um disfarce simples, mas que me ocultou com tranquilidade ao longo do caminho três vezes maior que tive de fazer, pra despistar quem quer que precisasse.

O nome era Eurídice. Bonita, estranha, perigosa, e altamente bem conectada... um mix destrutivo.

Rapidamente descobri que ela ███████████████ ███ ███████ ██████████████. E ela sabia da arma, mas acabou não se importando. Disse que ofereceria um trampo simples pra mim em troca da necessária faxina no meu nome, sumiço de alguns retratos-falados, e correlatos. Claro, topei imediatamente. Mas no fim das contas o trampo não era tão simples assim.

Era um trampo de pesquisa, recolhimento de intel, do zero. Nesse tipo de trampo nunca é fácil determinar o quão bem sucedido a gente foi... E alguns pagamentos correm o risco de serem afetados pela qualidade do produto final. Mas ███████████████ disse que era limpeza, que eu podia confiar na moça, apesar daqueles olhos estranhos.

Caí em cima. Um boato iniciado na ████████████ falando sobre uma corporação que estaria desenvolvendo um novo processo de desenvolvimento de "compensações". Esse é um mercado muito volátil, muito belicoso, e definitivamente, muito acirrado. Como se tratava de negócios corporativos, fui aterrorizar alguns burocratas para conseguir respostas. Acabei eliminando uma das fontes (legítima defesa), mas não antes de receber um dossiê razoável.

Com posse de dados suficientes pra uma entrega, voltei na Sra. Eurídice. Ela não pareceu satisfeita com as notícias, mas disse que procederia com o pagamento, e ofereceu um trabalho em nível contrato. Como eu já tinha me envolvido na primeira parte, achei melhor ficar de fora do contrato, mas indiquei meus antigos colegas. Se eles também limparem seus nomes, é lucro de qualquer forma.

Recentemente um trabalho foi tão bem finalizado que ganhei um favor de um figurão rico.

Resolvi gastar a moeda logo - nunca se sabe o quanto essas figuras malucas vão ficar vivos, ou o quanto vão se lembrar de suas dívidas no futuro. Os trampos feitos pros Mercador sempre foram muito bem pagos e garantidos.... mas decidi juntar a efemeridade do favor à meu desejo de resolver uma questão. A questão, em si, sendo o meu problema de fala e de memória - frutos diretos das minhas desventuras no reino dos soldados mortos em acidentes de experiências milaborantes mal sucedidas.

Minha expectativa era de que houvesse algum tipo de procedimento médico atual que resolvesse parcialmente o problema, mas que seria proibitivamente caro para meros mortais como eu. Asssim, procurei pelo Alex Mercador, dei o cash-in no meu favor, e fui prontamente atendido.

Com um telefonema eu já estava sendo levado para as instalações e todos já sabiam quem eu era, o que deveria ser feito, etc. Dinheiro é um lubrificante excelente mesmo. Optei pelo tratamento intensivo, feito em apenas um dia - tinha medo de represálias do exército, alguém descobrir que estou vivo, essas neuras. Avisei pra equipe médica que eles teriam de me conter com medidas de segurança mais.... firmes. E assim, fui novamente me meter a lab mice.

Quando minha consciência foi recobrada.... não sei muito bem explicar.

Eu ainda sou eu, Calliban. Mas algumas informações que antes eu não tinha acesso.... agora eu penso e elas simplesmente estão lá. O rosto dos meus pais, minha cidade natal, algumas cenas da minha juventude, o início da minha carreira militar.... Aos poucos vão retornando pra mim, imagens e cheiros e sensações. Minha gagueira, meu desconforto com as palavras..... completamente eliminado, quase que perfeito.

Devo ter passado quase 20h na clínica. Fui devolvido com o mesmo cuidado e deferência do início - coisa que nós lab mice não estamos muito acostumados. Testei minhas novas habilidades sociais numa noitada com Achara, a ninja coporativa do Alex Mercador.... Pode parecer bobagem, mas me parece que esse investimento foi uma ótima forma de gastar um favor.

Tive que repousar por dois dias seguidos para conseguir me livrar do peso das últimas ações. Mal conseguia pensar direito. Minha fala começou a travar, como se a gagueira estivesse voltando. ███████████████ ████ ████████████. Mas com dois dias mais quietos e bastante sono reparador, voltei a me sentir eu mesmo.

Procurei o Moz em Pedra Rachada. Fui direto pra lá sem muita cerimônia, afinal já fiz alguns trabalhos bem-sucedidos pro Moz e pro tio dele. Encontrei com os dois, expressei minha vontade de ficar uma temporada ali – seja com o restante do grupo, seja sozinho – e fui recebido com os braços abertos.

Claro, me comprometi que se por minha causa mais treta fosse atraída pro vilarejo, eu ia resolver a treta com fogo pesado.

Me instalei no local que o Moz preparou para usarmos coletivamente. ███████████████ ████ █████████ ██████████ █ █████████. Depois pedi ajuda, e trouxemos de Megacity 1 parte do meu arsenal para ficar aqui, e alguns extras a serem distribuídos em locações estratégicas de Pedra Rachada.

Espero que Zapata, Error1 e Butcher venham também. Alguns ficaram muito abalados com o último trabalho, verbalizaram uma certa decepção conosco, mas acredito que a tendência seja de que permaneçamos juntos.

Mais uma vez, ████ █████████ ████████████.

Eu gusto de Pedra Rachada. Cada dia que passa, gosto mais. Tem jeito de lar, de comunidade. Eu divido o bunker com um goblin? Divido. O Error chora de noite, quando acha que ninguém está ouvindo? Chora. O suor do Butcher parece que fede mais do que suor de cavalo? Parece mesmo.

Mas eu gosto desses caras, são um bom time.

Impressionantemente ninguém desse grupo tentou meter a faca nas minhas costas, ainda. Nem o Moz, que era praticamente garantido. Pelo contrário... Desde que decidimos passar essa temporada em Pedra Rachada, a maior parte das ações que vi foram em prol da comunidade, do grupo...

Zapata trouxe água limpa e melhorou o sistema de coleta local. Harris até achou que ele tem interesse em ficar ali de forma mais enraizada. Error criou uma rede local mais estável, trouxe velocidades de internet mais qualificadas pra um bando de mercs.

Moz então teve a ideia de dar um upgrade na clínica que o Zapata está montando, fazendo a “aquisição” de um equipamento caríssimo que estava sendo transportado em Megacity One. O plano era sólido, mas o segurança do equipamento estava num dia iluminado... Tomei alguns tiros, dei vários tiros.... ███████████████ ████ █████████ ██████████ █ █████████.

Na primeira oportunidade que tive, voltei a entrar em contato com a Achara.

Dei um tempo, para ela também não achar que estou envolvido demais. Falei que ia sair com um amigo e que estava aproveitando pra convidá-la também. Todos servimos em algum momento de nossas carreiras, frequentamos lugares onde costumamos esbarrar com vários outros como nós.... a desculpa perfeita.

Assim, tive a oportunidade de apresentar o Connor para ela.

E, o mais importante, tive a oportunidade de mostrar ela para o Connor, que é um dos melhores e mais competentes oficiais de inteligência militar que ainda estão vivos, deste lado do globo terrestre.

Ou seja, se no futuro, digamos, eu quisesse ser mais íntimo dela, e precisasse de maiores informações de background, ou uma checagem mais completa pra fins de segurança.... já seria um pouco mais fácil para o Connor desenrolar. Ele é bom nesse nível.

Ela aparentemente não pescou minhas terceiras e quartas intenções. Tivemos uma noite muito agradável, conversamos bastante – como adultos responsáveis e pessoas de bem fazem quando estão em bons momentos de suas vidas pacatas – evitamos entrar em duas brigas que seriam extremamente infrutíferas para os envolvidos e para o estabelecimento em que estávamos...

Entramos, claro, em uma briga, invariavelmente. Uma mais amistosa. E, confesso, fico sempre impressionado em como faço um par tão efetivo com Achara quanto faço com o Connor, que conheço desde que tenho todos os pedaços do meu cérebro.